quarta-feira, 29 de outubro de 2008

"o que que o baiano tem?"


ele é ex-pescador, come acarajé todos os dias, preparado pela mãe, com quem vive. começô a jogá bola, no futebol profissional do vitória, quando já passava dos 20 anos. dizem que um olheiro do clube baiano, de férias na costa repleta de coqueiros, água quente e cristalina e um sol de lascá da bahia, viu uma pelada em que o anjo negro destruiu. jogava descalso, na areia macia do litoral nordestino. depois disso, virô ídolo no vitória e atraiu a atenção do flamengo. não tardô em conquistá a torcida do mais querido. ganhô música e no auge da carreira se contundiu e desfalcô o time da gávea em sua campanha da libertadores do ano passado.

parafraseando dorival caymmi: "o que que o baiano tem?". por onde passô, deixô sua marca. muitos gols, alguns bonitos, como um de bicicleta alguns anos atrás e outros por pura sorte. tem o faro dos artilheiros e presença de área. num chega a sê um craque, como o romário.. ouso dizê que é ruim.. mas, tem o carisma dos grandes líderes. talvez seja o tempero que a mãe coloca nos acarajés diários.

barack obina neles!!

terça-feira, 21 de outubro de 2008

a travessia ou encontrovérsias insólitas > a saída

"Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia" (Guimarães Rosa).

A viagem é um movimento de saída de nossos hábitos – nossa perspectiva –, de um espaço-tempo em que estamos acostumados a viver e entrar numa outra dimensão – desemdida. Viajamos com o auxílio de uma droga, de um transe meditativo ou de incorporação ou mesmo um deslocamento físico a outro lugar. O que está em questão em qualquer dessas experiências é o deslocamento espaço-temporal do sujeito. A saída de seus limites e o seu encontro consigo mesmo.
Em Grande Serão: Veredas, Guimarães Rosa – ou Riobaldo – narra a sua experiência de sobrevivência e travessia no sertão. Repete(m) incessantemente que “viver é perigoso”. Por ser perigoso abre-se para o insólito a todo instante. O inusitado nos acompanha, nos assalta a todo momento. Ressaltar a travessia é compor “lares provisórios”, como quer Edward Said. Não há refúgio para o indivíduo com seus dramas internos e externos. Estamos sendo, acontecendo em fluxos de energia e sangue – jorros iridiscentes, para o argentino tropical – nas encontrovérsias do mundo entre os nosso arranjos e o imprevisível.
A travessia insólita se renova a cada encruzilhada. A cada instante que permitimos nosso encontro com o outro – transe – onde nossos hábitos são postos em questão e descobrem novas perpectivas - devorações. Viver em trânsito é experimentar o outro. Em sintonia, sincronia e simetria – na diferença – liberando o xamã de cada poeta.
E foi assim que Perlongher viveu a vida. É assim que vivi e vivo para escrever esse ensaio. Escrevivendo no tráfego, entre engarrafamentos, acidentes, auto-estradas, “humo” na estrada de Rosário à Buenos Aires.
Nestor experimentou com a antropologia e a literatura no Brasil, seguindo o grafite que cita numa entrevista: “por uma Argentina tropical e pagana!”. Em São Paulo e no Acre tentou encontrar essa Argentina, essa América Latina. Sua pesquisa acadêmica foi ensaística e de campo, nas ruas. Entre os michês, a militância gay, a poesia e o Daime. Experimentou o transe – escreviveu. Através de sua poética liberadora devorou a experiência de ser outro. Foi o michê e o caboclo do Daime – o poeta liberado.
Um outro tempo, um outro topos, um outro. Encontrvérsias com o outro, com o eu, onde esses limites já não importam. Composições exprimíveis e inexprimíveis materializando-se numa escrita curacriativa, rastreando o Acre, o ayahuasca, São Paulo, os michês – o tropical pagão.

sábado, 18 de outubro de 2008

parênthesis > outras perspectivas do eu

A verdade é que pela meditação você se torna cada vez mais você (David Lynch)

Qual o lugar do indivíduo nas sociedades tribais africanas ou indígenas? Como o candomblé, a umbanda, o Daime, enfim, essas espiritualidades brasileiras e contemporâneas resignificam a construção histórica da identidade? Como dialogam as noções coletivas dessa religiosidade com a produção da subjetividade capitalista?

"La producción de subjetividad capitalista produce individuos, hay que recordar que el individuo es una invención relativamnte reciente. En una tribu, la subjetividad no produce individuos. El individuo es una forma de subjetivación históricamente determinada. Los marginales, los locos, los negros, los indios están iniciando modos disidentes de producción de subjetividad" (Perlongher, 2004, p. 296-7).

O candomblé seria uma antropofagia negra brasileira da ancestralidade africana. Uma criação pau-brasil. Uma faísca dissonante, oriunda da diáspora negra. O Daime devora o uso ritual e espiritual da ayahuasca. Essas religiosidades, com suas normas e seus êxtases devoram a perspectiva da identidade racional ocidental e germinam outras perspectivas. Refletindo sobre o candomblé: o iyaô é um filho de santo, não pode ser entendido isolado e independentemente da família de santo e da linhagem da qual faz parte. Ser filho de um santo significa ser canal ou mensageiro daquele axé e segue uma linhagem ancestral de antepassados do mesmo tronco. Além disso, o iyaô tem um ori (cabeça) e um odu (um signo de vida): ori possibilita seu livre-arbítrio, suas escolhas e o odu narra seus ires (facilidades, aptidões e positividades) e seus osogbos (dificuldades, inaptidões e negatividades). Outra perspsctiva convivendo com o indivíduo analisável da psicanálise.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

a antropofagia – perspectivas

Experimentar o outro... ser o outro por um cenátimo... não dizer ou perguntar quem é o outro
- experimentá-lo –

aí mora o perigo e viver, lembra Riobaldo, é perigoso. Se vivermos os outros pensamentos, outros "locus de enunciação", como diria Walter Minolo, nos libertamos dos enlaçes do pensamento colonizador. Aí devoramos as Europas, os Brasis, os Índios e as Áfricas...
num giro
– ou numa gira de santo –
nos tornamos ameríndios, iorubás, negros mina, caboclos.
Recebemos os guias dos donos da terra.
Somos o caboclo tal e escrevemos com os caboclos, xamãs, ancestrais africanos, com os animais, com meu tio Iuaretê
– vida antropofágica ou devorações -
Composições deglutidas e digeridas. Conforme nos abrimos às afetações do mundo, aumentamos o risco. Maior o perigo, maiores os acidentes - dimensão incidental e insólita da vida. Não estaremos mais à salvo, fazendo o mesmo, aquilo que estamos acostumados a fazer, nosso hábitos reativos - reflexos tidos como instintivos.
O que são esses instintos? Quem determina o que é instintivo e instrínseco à nossa natureza humana e o que é adquirido pelo processo de socialização numa cultura? Talvez não importe. Tudo é artificial, recriado pelo homem em sua relação com o mundo - ação da natureza, logo do homem. Devorações de isso e aquilo, tudo ao mesmo tempo - sincronia. Economias e gastos desperdiçados.
"De seu lugar de espreita, o guerrilheiro aguarda o momento oportuno", são as palavras de Che Guevara. Que momento oportuno é esse? O de saltar nos confins do mundo, se pôr para fora, sair de si. Reintegrar-se ao mundo imbuído de forças e potências. Daí, conduzi-las com uma ação ética - gerar compaixão e ternura. Por mais que o guerrilheiro crie uma economia da sobrevivência, está aberto ao dispêndio de sua vida, aos perigos insólitos. Devorar e delira com rigor, isto é, dentro dos "locus de enunciação" que elegeu para sua luta.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

corpo exausto pelo gasto - liberando serotonina e endorfina ou conversas com a gamo

Narra Riobaldo: “o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia” (Rosa, op.cit., p. 80). Só há a experiência – a travessia na vida, pelos lares provisórios. Além disso, restam o ego, os objetivos, as perspectivas – por definição injustas, como diria Nietzsche – e a economia dos prós e contras. Na travessia, o excesso é desperdiçado – o andarilho esvazia a mochila para diminuir o peso. É gasto na geração de endorfina e serotonina, hormônios produzidos com o suor, com o movimento, no dispêndio do corpo que se movimenta e se exaure. Contou-me a filha do magma e pesquisadora em educação física: “a endorfina é produzida para inibir a nossa sensibilidade à dor e a serotonina é o hormônio responsável pelo prazer e o bem estar. Ambos são liberados com o exercício físico”. Portanto, no dispêndio sem a economia de controle de gasto, a filosofia é esgotar, desperdiçar-se, gozar no delírio do corpo exausto.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

zumbido

não sai da cabeça.. vai e volta.. inquietação. como uma cuíca ou um chucalho incessantes. o sono vem e não leva. não embala o suficiente, não conforta o corpo. os olhos pesam, porém não se fecham. não sai da cabeça.. vai e volta.. inquietação.. zum-zumbido. como um motor de moto - estridente - ragendo os dentes. vem vindo de longe e já sabemos que vai chegar. tão perto, tão alto e irritante. "pior do que não ter vista em casa, é não ter silêncio", ecoavam essas palavras em zum-zumbido, como um mantra irritante. não sai da cabeça.. vai e volta.. inquietação.