terça-feira, 11 de novembro de 2008

(diário galego)

san lourenzo 46, terça 11 de novembro de 2008


Ando em crise com o Eu que escreve, que se desenha num suposto diário. Um Eu identitário que narra seus dramas e peripécias de viajante. Admito que parte dessa crise se dá porque nada de interessante acontece comigo. Não faço nada a não ser ir aos festivais de cinema, escrever emails para saudosos amigos e parentes e para a mulhé que amo. Não mexo muito nas “desordens das fantasias”, o diário on line – vulgo blog. Por isso, pouco escrevo nesse espaço formalizado para as confissões de inconfessáveis acontecimentos. Emoção e adrelina de andarilho aprontando pelas ruas galegas de Santiago. Não tem sido assim.


Estou lendo a confissão, essa sim emocionante e, até certo ponto, coletiva – geracional – de Luis Buñuel. A geração de 27, contanto, entre outros, com ele próprio, Salvador Dalí, Frederico García Lorca e Pepín Bello transtornou o cenário artístico espanhol e mundial. O curioso é que saí do Brasil para vir à Espanha, buscando algo menos provinciano e careta que o Rio de Janeiro. Como dizia Nestor Perlongher, o Brasil tem uma cultura viva, potente, cuja mescla produz revoluções culturais constantes, ao passo que, no dia a dia, somos de uma caretice sem par. E leio uma passagem de Buñuel que narra sua chegada à Paris, em 1925. Segundo ele, uma coisa saltou aos seus olhos espanhóis – e olha que não era galego, mais tradicional ainda - : casais se beijando e se atracando à plena luz do dia e pelas ruas de Paris. E vim para cá, estou aqui. Saio da antropofagia cultural brasileira, reacionária no trato diário, para a Espanha, o país onde os casais, até bem pouco tempo atrás, não se beijavam nas ruas. Porém, é a Espanha de Buñuel e a via láctea de Santiago pôde ser vista sob suas câmeras – alívio..

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