quinta-feira, 15 de abril de 2010

antropofagia – nos rastros da opção descolonial (parte I)


Nessa batalha, uma máscara pintada ou o chocalho de um xamã pode vir a ser vital para a captura de um satélite de comunicação ou de uma rede secreta de computador (Hakim Bey).

         O modo de operação do pensamento fronteiriço que considero mais potente é através da antropofagia. No intuito de tensionar o pensamento oriundo da modernidade / colonialidade faz-se necessário afetá-lo ou, mais bem, contaminá-lo com outras epistemologias, ontologias e tecnologias. O chocalho do xamã seria uma maneira. Reforço que o xamã não é um bruxo, mas sim um cientista ou médico; noutras palavras, é um cientista bárbaro solto no espaço liso formulando suas problemáticas cosmológicas. O xamã devorando e sendo devorado pelas máquinas cibernéticas pós-industriais, como os satélites e os computadores, torna-se um bárbaro tecnicizado dentro de uma “modernidade fronteiriça”[1]. Daí, emergem diferentes geografias e histórias, entre o oriente e o ocidente, o bárbaro e o civilizado.
A teoria e prática antropofágicas têm um modo de operação equivalente ao das ciências nômades, afinal de contas a antropofagia é uma ciência nômade. Ambas situam-se no exterior do Estado, em relação de diferenciação entre as matérias e forças que as compõem através de redes múltiplas e rizomáticas. Impõem ritmos próprios ao se desterritorializarem como os pássaros migrantes atravessando terras, mares, ilhas e desertos. Informam e recriam linguagens como diz Mignolo: “um pensamento desde outro lugar, imaginando uma linguagem outra, argüindo por uma lógica outra” (apud Escobar, 2003: 64). As ciências nômades e antropofágicas já são outras e, desde já, desobedecem epistêmica e civilmente as regras formais das ciências régias do Estado. Esta é a opção descolonial que experimenta, assim como, Benjamim e Álvaro de Campos o fizeram, em outros espaço-tempos de enunciação. 

A dinâmica das encontrovérsias que motivam as encorporações-aglomerações-devorações ente natureza e cultura respeitam certas regras equivalente ao nomos, de outro modo seria apenas um canibalismo, uma batalha de todos contra todos. Para Haroldo de Campos, “o canibal era um ‘polemista’ (do grego pólemos = luta, combate), mas também um ‘antologista’: só devorava os inimigos que considerava bravos” (Campos, 1992: 235). O rigor é imprescindível no jogo antropofágico, ou seja, é preciso escolher nossos inimigos e, dentre eles, o mais combativo ou o mais inteligente, uma vez que ao devorá-lo apropriar-nos-emos de sua força. 

[continua]


[1] O termo é de Júlio Ramos que situa as experiências, de um lado, de Walter Benjamin usando haxixie, nas periferias de Marselha e, de outro lado, do sujeito lírico do poema de Álvaro de Campos, “Opiário”. Em ambos os casos, os personagens refletem sobre a modernidade ocidental em confronto com o oriente, a partir da experiência fronteiriça com as drogas, com a região portuária de Marselha e a viagem a China e a Índia.

Um comentário:

Crii's disse...

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Cristina de Moraes